Serão os clubes de futebol multinacionais?

Ciclicamente, quando as empresas de consultoria lançam os seus relatórios e respectivos rankings com os clubes mais ricos do mundo, as marcas esportivas mais valiosas e outras listas do gênero, a comparação entre o futebol e o mundo empresarial é recorrente. O apelo internacional de clubes como Real Madri, Manchester United ou Bayern de Munique permitem o questionamento: será que podemos comparar os grandes clubes internacionais com empresas multinacionais?

O primeiro ponto de comparação entre clubes de futebol e multinacionais é a estrutura. Juridicamente, multinacionais são empresas que buscam o lucro, enquanto clubes, tradicionalmente, foram associação sem fins lucrativos. A partir dos anos 1980, quando os contratos da venda dos direitos de transmissão televisiva começaram a se tornar muito valiosos, em muitos países, a realidade dos clubes teve que ser ajustada para que o lucro fosse permitido, mas principalmente para que profissionais fossem contratados e remunerados por isso, pois como associações sem fins lucrativos, com exceção dos jogadores que já eram profissionais, o trabalho era em grande parte não-remunerado. Isso não quer dizer que todos os clubes tenham os mesmos estatutos jurídicos, existem os clubes que são cotados em bolsas como sociedades anônimas, e outros são sociedades esportivas e muitos ainda são clubes sem fins lucrativos.

Outra questão a ser avaliada é o objetivo final de um clube. Segundo especialistas em Economia do Esporte, organizações esportivas de ligas fechadas – modelo das ligas nos EUA – e de ligas abertas – modelo europeu e sul-americano – acabam por ter objetivos diferentes, por conta das diferenças na gestão das suas ligas, sendo as principais delas a possibilidade de rebaixamento e a divisão de receitas, tendo assim as equipes de ligas fechadas o objetivo de lucro – tal como empresas tradicionais – enquanto, os clubes de ligas abertas têm como finalidade maximizar as vitórias. Na busca por vitórias, as equipes buscam recrutar os melhores talentos, que tendencialmente representam o maior salário, assim, num dado momento, as equipes que buscam o lucro terão que avaliar o tamanho do lucro desejado, em relação ao desempenho esportivo. Por outro lado, os clubes que maximizam as vitórias, não se importam com o lucro, ou seja, todas as suas receitas podem ser reinvestidas no clube, buscando um lucro zero, de forma que mais dinheiro possa significar melhores condições e melhores jogadores. O problema se coloca quando a gestão é feita de maneira irresponsável, e as dívidas se acumulam continuamente.

Normalmente, quando se fala em multinacionais, a referência são grandes companhias industriais. No entanto, clubes de futebol estão mais próximos de um setor de serviços, e, portanto, devem ser analisados segundo os seus fatores de produção, que são capitais humanos e não físicos, bem como transações no mercado internacional. Grandes clubes contam com uma mão-de-obra vastamente diversificada, tendo sido notável que equipes do Arsenal, em anos recentes, tenham entrado em campo e no banco de reservas sem nenhum jogador inglês. Além disso, outros parceiros dos clubes são internacionais, sejam clubes que trocam experiências ao nível técnico, empresas que patrocinam a organização e os eventos ou empresas de mídia.

É preciso fazer a ressalva que apesar de todo esse processo de globalização, ainda há fortes elementos nacionalistas no futebol. Apesar de todos os estrangeiros e o seu apelo global, a Premier League continua sendo o “campeonato inglês”, disputada em estádios ingleses, para um público, maioritariamente, nacional. Além disso, o principal evento esportivo do planeta, a Copa do Mundo, coloca frente a frente nações em disputa de um título.

No entanto, essas barreiras espaciais do esporte são quebradas com as possibilidades oferecidas pelos meios de comunicação. A partir do momento em que o espetáculo esportivo é mediatizado, ele pode ser produzido, empacotado e distribuído para todos os cantos do globo. Dessa forma, um clube não está mais limitado a sua própria região, sua audiência se torna global, principalmente, quando atinge fases finais da Champions League. Não é por acaso, que a televisão se tornou a melhor e principal parceira das organizações esportivas.

Os recentes processos de modernização e racionalização das organizações esportivas permitiram a contratação de profissionais mais voltados para o mercado, contribuindo para um aumento das receitas dos clubes esportivos. Embora apresentem ainda um modelo de negócios muito particular, reconhece-se que o crescimento dos clubes que já estão no topo dos seus países passa, em grande medida, por uma expansão internacional refletida na sua mão-de-obra e parceiros, e cuja importância da mídia é fundamental. Por fim, pode-se concluir que embora nem todos os clubes estejam no patamar global, aqueles poucos que lá chegam, apesar de suas particularidades, podem ser relacionados com empresas multinacionais.

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