Barba, cabelo e bigode (Brasil, Lucio Branco, 2016)

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Em uma determinada situação você se sente vivendo intensamente, vivendo tudo aquilo que você pode. A alegria é a prova dos nove e a liberdade, a felicidade são a mesma coisa e são o objetivo do homem como ser humano.

(Afonsinho; ao fim da película, aproximadamente às 2 horas de exibição).

 

Fazer barba, cabelo e bigode constitui expressão que indica um percurso completo, ou seja, implica uma experiência abusiva: extensiva e intensiva (isso para não entrarmos em meandros de conotação outra – ver https://www.dicionarioinformal.com.br/barba+cabelo+e+bigode/). Nesse sentido, e complementarmente às menções estético-capilares dos protagonistas, o título é bastante pertinente. Faz juz às trajetórias de seus três personagens: Afonsinho, Nei Conceição e Paulo Cezar Caju.

Para todos aqueles que gostam de futebol, tratam-se de nomes usualmente associados a pelo menos a duas características marcantes: à reconhecida qualidade técnica e à força da personalidade. E também, é claro, às suas posições contestadoras. Há uma enormidade de material a respeito: reportagens, artigos, entrevistas e filmes.

Destacamos o documentário Passe Livre (Oswaldo Caldeira, 1974, a partir da vitoriosa disputa judicial de Afonsinho pela possibilidade de dispor de seu próprio passe) e a série de João Moreira Salles e Arthur Fontes, Futebol (1998), novamente incluindo Afonsinho, mas também o Paulo Cezar Caju e outros (indicamos ainda a leitura do estudo de Euclides de Freitas Couto –  Da ditadura à ditadura – uma história política da futebol brasileiro 1930/1978. Niterói, Ed. UFF, 2014).

O filme em questão coloca o tema novamente em foco. A película estreou bem, saindo-se vencedora da sétima edição do Festival de cinema sobre futebol, o Cinefoot (2017 – http://www.cinefoot.org/e-campeao-conheca-os-vencedores-do-cinefoot-7/).

Sem grande preocupação cronológica, a obra remonta episódios relacionados ao mencionado trio futebolístico. Não se restringe ao mundo do futebol, no entanto (embora as cenas de jogo tenham um bom papel ao longo da fita). Repassa os desentendimentos de Afonsinho no Botafogo (no qual a questão da manutenção ou não de sua barba ganhou uma importância que somente a época parece permitir entender), o corte de Paulo Cezar do escrete de 1978 e a história da (não) efetivação de Nei Conceição pelo Palmeiras. Dentre outras histórias. Nessa conversa também não fica de fora o estado atual do futebol brasileiro, cuja situação não é bem avaliada pelos depoentes; tanto organizativa como tecnicamente. Nas suas duas horas de duração, temos contato com muitas cenas e fotos de época, imagens de jogos e da vida pessoal e atual dos três “rebeldes” do futebol. Há ainda uma participação especial de Daniel Cohn-Bendit, em um papo com Afonsinho.

Conforme mencionamos acima, essas e outras narrativas ganham maior implicação ao envolverem temas como racismo, ditadura, participação política: a vida dentro e fora dos campos. É nesse âmbito mais geral que a obra ganha importância como registro histórico e como espaço de discussão. Mas também como libelo humanizante. Este parece ser o sentido do trecho em epígrafe, com o qual iniciamos este post. Por essas e outras, fica o convite ao longa de Lucio Branco.

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